Portas viu o Pepe na UERJ: Percepções sobre a Visita do Mujica!

por Fernando Beserra

Caros amigos,

O post vem atrasado, mas por uma boa causa. Na última quinta-feira, 27 de agosto, estive na UERJ, horário que sai o post do Portas da Percepção aqui no Hempadão, para prestigiar a presença do Pepe Mujica, senador uruguaio, e ex-presidente do primeiro país do mundo a legalizar a maconha. Expresso isso, compreendendo que a legalização só pode ocorrer após a sua proibição, historicamente recente. Mujica lotou a UERJ e, como disse um amigo, tratou-se daqueles momentos nos quais sentimos na pele um discurso tão lúcido quanto verdadeiro, na medida certa entre o pé no chão e a utopia. Nós, brasileiros, temos muito o que aprender com nossos amigos uruguaios. A solidariedade da América Latina é fundamental em vários sentidos e, por que não, também na produção de uma política de drogas antiproibicionista com seu formato próprio e adaptada a nossa realidade. Não é preciso que copiemos a Europa, como disse Mujica, mas que façamos nossa política e, para tal, temos muito o que aprender com nossos ancestrais: os povos originários das Américas.

Mujica falou de diversos temas, a começar por temas mais filosóficos como a liberdade. A defesa da liberdade, como disse, sempre vem acompanhada da responsabilidade e, finalmente, apenas somos livres quando ajudamos o outro. O simpático uruguaio nos brindou com as palavras:

“Os estudantes têm que se dar conta que não é só uma mudança do sistema, é uma mudança de cultura, é uma cultura civilizatória. E não tem como sonhar com um mundo melhor se não gastar a vida lutando por ele. Temos que superar o individualismo e criar consciência coletiva para transformar a sociedade”.

Foi ao ponto. Não se trata de mudar a infraestrutura social para, depois, pensar em alterar/transformar a cultura. É preciso mudar a cultura aqui e agora. Portanto, é preciso coragem para mudar e transformar e, ao transformar, que se faça com solidariedade e atento a história da cultura e do povo, uma transformação com participação conjunta, ombro a ombro, por aqueles afetados pelos problemas da cultura existente. No campo da política de drogas, portanto, há de se falar: nada que me diga respeito, sem o meu consentimento. É preciso construir o protagonismo dos usuários e usuárias de substâncias tornadas ilícitas, para que os usuários possam participar e construir novas políticas de drogas. E isso não se fará apenas entre os usuários. É preciso um esforço civilizatório, de fato, para barrar o avanço conservador no Brasil, que quer empurrar goela abaixo a redução da maioridade penal; o aumento das punições dos crimes relacionados às drogas e outros modos de criminalizar, vigiar e punir corpos e mentes “desviantes” do modo de operar da elite cultural-econômica. Aprenderíamos muito mais ao estudar a compreender as tecnologias do sagrado que os povos originários das Américas nos brindaram, como em seus usos da ayahuasca que, aliás, tantos potenciais possui para distintos usos terapêuticos.

Mujica encheu nossos corações de esperança. Agora estes corações esperançosos devem construir sua própria política, lado-a-lado, como animais políticos e gregários, como disse o corajoso uruguaio. Uma política que fortaleça as liberdades fundamentais, inclusive do direito ao próprio corpo, que favoreça as práticas de saúde, cuidado, de promoção de cultura, ao invés da violência e da barbárie. E a Guerra às Drogas representa, exatamente, a violência, o assassinato em massa: a barbárie.