Os novos usos rituais das plantas de poder

por Catiusia

Em meu primeiro artigo aqui no Portas da Percepção, gostaria de compartilhar algumas ideias e teorias sobre o uso ritual de enteógenos. Apresentarei algumas discussões sobre o recente uso cerimonial de substâncias psicoativas nas culturas ocidentais, o que até pouco tempo atrás era classificado como primitivo e alvo de muitas críticas, especialmente pelas religiões já estabelecidas.

É sabido que povos indígenas e populações tradicionais em todo o mundo fazem uso de plantas visionárias há milhares de anos em rituais tribais. Grande parte deles constituem uma forma de conexão humana com os espíritos da natureza, os quais acreditavam estar presentes nas plantas de poder. Os componentes químicos ativos das plantas enteógenas, quando usados dentro dos contextos de cura e propósitos xamânicos, desempenharam papéis importantes na formação cultural das tribos antigas, especialmente em rituais onde se combinavam uma substância psicoativa, a música e a dança, levando ao alcance de um estado de transe.

Infelizmente, o conhecimento e a utilização destas várias substâncias psicoativas, produzidas por várias espécies diferentes de plantas, foi extremamente limitado para o consciente dos povos ocidentais. Devido a essa falta de conhecimento, as tribos e seus rituais xamânicos eram vistos com maus olhos pelo catolicismo e pelas crenças ocidentais já sedimentadas. Esse é um dos grande motivos pelos quais tantas tribos foram dizimadas e muitos desses traços culturais foram perdidos (cita-se como exemplo os povos indígenas latinoamericanos, povos africanos, etc.). Até que no início dos anos 1940, a grande descoberta do LSD pelo Dr. Albert Hoffman levantou uma faísca de interesse sobre os entorpecentes entre as culturas modernas. A partir de então o uso de plantas de poder e mesmo de substâncias psicoativas sintéticas vem crescendo.

Cristopher Larkin em sua tese de doutorado (2003), propõe que com o (re)surgimento das substâncias entorpecentes no ocidente, uma nova cultura espiritual começou a surgir, como uma reintrodução da prática espiritual global antiga, já formada através do uso ritual de psicodélicos. Essa nova cultura ocidental, pós surgimento do LSD, seria uma reintegração das experiências xamânicas, despertando uma nova consciência aos que fazem uso ritualístico dos psicodélicos e não apenas uso recreacional.

A noção de um ressurgimento do conhecimento em torno das substâncias psicoativas dentre as culturas ocidentais, bem como a nova consciência espiritual formada a partir daí, está nitidamente ligado aos estudos de Terence McKenna. Através de um olhar multidisciplinar sobre as substâncias psicoativas, McKenna conseguiu traduzir seus conhecimentos numa linguagem simples, contribuindo enormemente para a evolução do conhecimento acerca dos enteógenos. Particularmente, admiro sua formação acadêmica, especialmente o mestrado em Xamanismo e Conservação de Espécies Botânicas, um “sonho de consumo”.

O grande legado que nos deixou McKenna, e vários outros grandes estudiosos de plantas enteógenas, diz respeito às transformações internas e à ascenção da consciência em cada um que vive uma experiência com um enteógeno. Felizmente a cultura ocidental tem estado mais aberta à esses conhecimentos, mas ainda estamos carentes de uma legislação mais moderna a esse respeito.

Para quem quiser se aprofundar nesse campo tão espetacular que são os enteógenos, segue aí alguns títulos do mestre: Food of the Gods (O Alimento dos Deuses – 1992), True Hallucinations (Alucinações Verdadeiras – 1992) e Invisible Landscapes (Paisagens Invisíveis – 1993).