Com legalização, Las Vegas ganha fazenda ultratecnológica de maconha

Touquinha de cabelo, proteção nos sapatos, luvas, máscara e macacão. Parece que vamos entrar numa sala de cirurgia, mas o cheiro adocicado logo entrega, após a passagem por uma pesada porta de segurança.

Estamos em uma plantação de maconha “indoor”, uma das mais tecnológicas do mundo, a 15 minutos a pé da famosa avenida de cassinos de Las Vegas, nos EUA.

Fonte: Folha

Um dos donos da Desert Grown Farms, o empresário Armen Yemenidjian, 31, é também proprietário de três lojas de maconha na cidade, um investimento que ele fez depois de largar a licença de operador de jogos de azar.

“No cassino, alguém sempre tem que perder para alguém ganhar. Com a cannabis, todos ganham”, disse Yemenidjian à Folha. “É uma chance imperdível poder participar de uma indústria totalmente nova desde seu início.”

Ambas as indústrias têm similaridades, como uma intrincada regulamentação, alta movimentação de dinheiro vivo —já que bancos não aceitam transações de negócios de maconha porque a droga continua ilegal no âmbito federal— e estrutura pesada de vigilância e segurança. “É a mesma sofisticação de equipamentos”, diz.

Las Vegas fica no Estado de Nevada, que desde julho liberou o comércio de maconha recreativa. As lojas que vendiam a droga só com receita médica agora atendem a qualquer um maior de 21 anos, inclusive turistas. Os primeiros dias foram marcados por longas filas, fogos de artifício e falta de estoque.

Cerca de 50 funcionários trabalham na Desert Grown Farms, um complexo de 5.000 metros quadrados em operação há oito meses.

O ciclo intenso de plantação traz uma colheita nova a cada duas semanas.

Pelos sete salões de cultivo, são reproduzidas condições de primavera, com luzes ligadas 24 horas por dia, por exemplo, ou outono, com temperaturas mais amenas.

Um sistema controla luzes, temperatura e umidade, além da irrigação de água e nutrientes. “Isto elimina erro humano e faz o processo ser mais preciso. Nada é medido à mão. Conseguimos um produto mais estável”, diz o diretor de cultivo Alessandro Cesario, 26, formado em horticultura e especializado em cultura hidropônica numa universidade da Pensilvânia.

“Sabia desde os 16 anos que queria trabalhar nesta indústria. Fiz faculdade pensando nisto”, conta ele.

Cesario é responsável pelas 10 mil plantas do complexo, que geram cerca de cinco toneladas de maconha por ano. O processo é todo feito por clonagem de plantas femininas e não por sementes.

Cada uma recebe uma etiqueta com códigos. “Desde a clonagem até a venda, consigo rastrear tudo. Se uma planta começa a ter performance ruim, posso voltar à planta mãe e eliminá-la.”

Yemenidjian, que opera as empresas junto com uma filantropa e um empresário do setor imobiliário dono de um jornal local, gosta de aplicar o linguajar de Vegas. “Usar sementes é como jogar roleta com sua colheita. Clonando você usa uma genética aprovada e testada.”

O empresário é filho de um famoso figurão de Hollywood, Alejandro Yemenidjian, ex-contador de celebridades que ajudou a recuperar e vender o estúdio MGM nos anos 2000, além de operar o cassino Tropicana até 2015.

De família armênia, o pai nasceu em Buenos Aires e até hoje mantém ligações com a Argentina. “Ele é provavelmente a melhor vantagem competitiva que tenho. É um gênio com quem posso sempre contar”, comenta.

As vendas da droga devem trazer US$ 60 milhões em impostos nos próximos dois anos. Seu consumo é proibido em locais públicos como cassinos e bares. Pode gerar multa de US$ 600 (R$ 1.900).

“A solução é óbvia, queremos legalizar salas de consumo”, diz Yemenidjian. “Não há outro produto que seja legal para comprar mas ilegal para usar. Com certeza o álcool passou por algo similar com o fim da proibição.”