Cannabis Medicinal: seminário internacional reúne mães, ativistas e especialistas sobre o tema

Expectador tirando foto do gigante painel com a linha do tempo da “Cannabis Medicinal na Humanidade”

II Seminário Internacional Cannabis Medicinal promoveu o encontro da classe médica com advogados, ativistas, produtores de conteúdo e público interessado sobre o tema

No último final de semana de junho rolou no Instituto Europeu de Desing o II Seminário Internacional Cannabis Medicinal: Um Olhar para o Amanhã, promovido pela Fiocruz em parceria com a APPEPI. O evento ocorreu em dois dias e contou com palestras, workshops e um excelente espaço para convivência entre personalidades da militância canábica.

“Melhor evento sobre maconha medicinal que eu já vi no Brasil”, disse Emílio Figueiredo, advogado da Reforma (Rede Jurídica pela Reforma da Política de Drogas). Segundo ele, o grande mérito da organização é de “conseguir fazer um evento desse tamanho, com essa estrutura, sem banner de grandes marcas da indústria farmacêutica. Isso é algo fenomenal”, concluiu.

No domingo, assim que cheguei, o auditório estava cheio para aprender sobre o projeto piloto de cultivo na Argentina. Uma das melhores partes de eventos como esse é a possiblidade de reunião da classe médica, junto a pacientes, diante dos ativistas, misturados com o público em geral. Entre um intervalo ou outro, no meio de um apetitoso coffea-break, encontrei um expectador do canal que se disse maconheiro há 37 anos. “To achando sensacional. Muita fala boa dos médicos, muitos depoimentos emocionantes. Eu já chorei a beça”, confessou ele.

Foto da foto durante breve pronunciamento de Carlos Minc no II Seminário Cannabis Medicinal: Um Olhar para o Futuro

De fato, é emocionante. De um lado representantes da indústria ou iniciativas empreendedoras lutam pelo direito de ganhar dinheiro com o mercado canábico em expansão. Do outro, mães e crianças esclarecem o quanto a cannabis é eficaz e capaz de ajudar no tratamento de diversas enfermidades. No meio, bem que poderia estar uma planta de maconha, observando tudo. Mas, infelizmente, ela ainda é proibida. Então o único vegetal exposto no Seminário eram os tomates do All About Tomato.

Na hora do almoço, por coincidência, sentei ao lado de uma senhora de 66 anos portadora da síndrome de Crohn. Entre um papo e outro ela confessou que faz uso do óleo medicinal, cultivado por um familiar. Aparentemente sem dor e muito simpática, ela estava notavelmente feliz por participar do seminário, tendo a oportunidade de aprender e compartilhar sua experiência.

Ivo Bucaresky, ex-diretor da ANVISA

 

Primeiro dia – Sábado 29/06

Pela manhã o Auditório viu passar uma turma de peso fazendo a Mesa de Abertura, a partir das nove horas da matina. A presidente da FioCruz, Nísia Trindade, deu boas vindas junto a Coordenadora da Appepi, Margarete Brito. Também na mesa esteve a participação importante do Dr. Eduardo Faveret e Alessandra Bastos, diretora da ANVISA. Denise Pires, futura reitora da UFRJ, completou o time selecionado a dedo.

Na sequência, o tema foi “Cannabis medicinal e sociedade” e quem ficou no auditório ganhou uma dose de reflexão sem moderação proposta pela filósofa Viviane Mosé. Outro a roubar a cena foi o neurocientista Sidarta Ribeiro, muito elogiado e mencionado várias vezes, entre os expectadores, como a palestra mais marcante do dia.

Atividade rolando na Sala 1, que permaneceu lotada do início ao fim

Enquanto isso, na sala 1 foi lançada a campanha Repense 2.0 juntamente a associações da Paraíba, São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Em seguida, um debate sobre “o papel da imprensa na agenda da cannabis medicinal”, onde representantes dos grandes veículos de comunicações conversaram sobre como a planta reverbera em seu círculo estreito de produtores de conteúdo para grande massa. Por fim, “políticas públicas e cannabis medicinal” foi o tema do bate papo que contou com a participação da sempre coerente Luciana Boiteaux, professora da UFRJ.

Na sala 2 foi possível assistir um workshop sobre “Óleo Artesanal: do cultivo a produção”. A segunda atividade deste espaço foi a conversa sobre como obter acesso à cannabis por vias jurídicas como habeas corpus, planos de saúde e fornecimento pelo estado. Por fim, “Cannabis e outros usos na perspectiva terapêutica” fechou os trabalhos com as salas sempre lotadas.

 

Segundo dia – Domingo 30/06

Valeu muito a pena colar e ver de perto essa movimentação fantástica em torno da maconha medicinal. Presenciar um evento com nomes de peso, organização extremamente competente e num local com vista paradisíaca como aquele pareceu um sonho. E não era. Conhecer cada novo leitor, rever cada antigo aliado, foi a prova de que nossa militância segue vivíssima, com conceito das ruas aos seminários.

Na apresentação mais aplaudida da manhã, Emílio Figueiredo aproveitou seu tempo no mic para soltar pedradas como: “Auto cultivo é um ato de liberdade. O cidadão tem que ter o direito de plantar”, e ainda “maconha não é ping-pong nem boliche. Maconha não é recreação”, argumentou, arrancando barulho da plateia. Finalizou lembrando que “enquanto tiver morrendo preto e pobre na favela, não vai ter maconha medicinal certa que sirva como remédio suficiente para promova a cura dessa paranoia coletiva que é a proibição” e só aí já tinha valido o ingresso.

Emílio Figueiredo em sua apresentação, observado pelo ex-diretor da ANVISA

Em uma troca de sala para outra, deu tempo de conversar com Leandro Stelitano, representante da Cannab BA. “Eu to ouvindo todo mundo falar mal do controle exigido pelo governo para o plantio de maconha, mas é claro que tem que ter controle. Tão pensando que é coisa de outro mundo, mas o tal aparelho de biometria dá pra comprar na 25”, disse, se referindo a famosa rua de comércio popular localizada em São Paulo.

No domingo mais uma vez a sala 1 e 2 estiveram lotadas, provando que o interesse pelo o assunto é de fazer transbordar qualquer auditório. Houve palestra sobre “Cannabis e Autismo”, “Sistema Endocanabinóide” e “Cannabis e Psiquiatria”  de um lado, enquanto o segundo espaço abrigou bate-papo sobre “Cannabis e Oncologia e Dores Crônicas” e apresentação de finos trabalhos acadêmicos sobre a ganja.

Ao fim, a festa de encerramento no magnífico terraço do IED contou até com banda cover. Mas pouco antes disso, ainda no auditório principal, a ativista peruana Francesca Brivio fez um relato emocionante de sua luta pela cannabis medicinal. “Uma palavra que pode definir cannabis, para mim, é esperança. O que posso dizer hoje em dia sobre maconha é que ela me proporciona qualidade de vida”, e o sonho de que isso seja possível para qualquer um continua sendo nossa meta.

Francesca Brivio, representante da Drops of Hope, do Peru, falou sobre a importância de se facilitar o acesso ao remédio

Nos resta agradecer a oportunidade e enaltecer o empenho de cada um dos responsáveis, colaboradores e participantes deste Seminário. Todos os encontros que rolaram no auditório estão em vídeo e podem ser assistidos na página da APEPI no Facebook.