Violência, Poder e a Ineficiência da Proibição! [Politiconha #2]

por Jonas França Leal

Nas discussões mais importantes da Ciência Política, meu curso de graduação, um assunto de peso é o conceito de poder. De muitos autores, na minha opinião, quem melhor trabalha a ideia de poder é Hannah Arendt (foto). Perseguida por nazistas e estudiosa da política, da filosofia, da ética e da sociedade, Arendt compreendia que o poder é a capacidade humana de agir em conjunto.
 

E ela ainda nos ensina um pouco mais: para Arendt, a violência é o inverso do poder. Quem tem respeito e estabelece uma relação justa de poder não tem a necessidade de recorrer à força. Mas o que essas observações tem a ver com o debate sobre a legalização da maconha?

Antes de concluir o pensamento, vamos aos fatos: a letalidade da Polícia Militar de São Paulo atualmente é a mais elevada dos últimos dez anos. No mesmo período, enquanto o número de mortes pela PM cresceu, o total do número de crimes permaneceu no mesmo patamar. A cada 32 horas, um policial é morto no Brasil. Em terras paulistas, cuja população é oito vezes menor que a dos Estados Unidos da América, os policiais militares cometeram 6,3% mais mortes que o total das forças policiais norte-americanas.

Não há como discutir políticas públicas de segurança, no Brasil, sem ao menos se contestar a instituição da Polícia Militar. Como o próprio nome diz, trata-se de um mecanismo violento e estratégico criado para supostamente garantir a integridade individual e o respeito ao Estado de direito. Em sua própria nomenclatura, a Polícia Militar já admite uma contradição hipócrita fundamental: garantir a democracia por meio da violência.

Como escrevi em meu texto de estreia no Hempadão, o trabalho que a Polícia desempenha na manutenção da guerra às drogas só fez aumentar a violência urbana, o abuso da força e a prática do racismo declarado – vale dizer que duas em cada três pessoas mortas pela Polícia Militar são negras ou pardas.

A criminalidade não reduziu no ritmo com que as mortes se multiplicaram. Ano após ano, a manutenção do sistema repressivo policial brasileiro deixa mais claro seus propósitos: propagar as desigualdades sociais, gerar violência com a desculpa sagrada da proteção e tratar o consumo de drogas como um assunto militar ao invés de civil.

Ao destinar uma instituição militar para tratar de uma questão social como o uso da Cannabis, o Estado assume que este fenômeno requer violência ao invés de estudo e diálogo; renega aos consumidores, produtores e defensores da maconha seu direito à cidadania e tarja todos como criminosos.

Hannah Arendt parece fazer sentido em nossa realidade. Enquanto o Estado investir na violência, perderá seu poder democrático. Enquanto a guerra for declarada no lugar da legalização e do amadurecimento civil, mais frágil será a justiça e mais forte será o medo. Enquanto houver repressão, perde-se a legitimidade.

O que eu penso sobre o término da Polícia Militar e sobre alternativas para a segurança pública fica para um texto qualquer do futuro. Por enquanto, fico satisfeito em dizer que a estratégia de repressão e violência contradiz todos os objetivos de uma democracia e que, na construção de uma cidadania mais ativa e justa no Brasil, a repressão contribui para atrasos e deficiências civis de forma irresponsável.

Para produzirmos um debate profundo e consciente sobre a legalização da maconha, temos o dever de reconhecer que a militarização de assuntos civis e individuais apenas gera abusos e contradições. A vida privada e o direito de escolha de quem fuma maconha não podem e não devem ser violados pela violência do Estado. E é por isso que o próximo texto da Politiconhatratará justamente sobre a inconstitucionalidade da Lei de Drogas no Brasil.

Até sábado que vem!

FONTES:

http://www.diariosp.com.br/mobile/noticia/detalhe/49039/Policia+Militar+mata+mais+pardos+e+negros http://www.ibccrim.org.br/noticia/13905-Em-cinco-anos,-PM-de-Sao-Paulo-mata-mais-que-todas-as-policias-dos-EUA
http://www.hojeemdia.com.br/m-blogs/r%C3%A1dio-patrulha-1.530/brasil-tem-um-policial-morto-a-cada-32-horas-229-morreram-este-ano-1.51320
http://ponte.org/pm-de-sp-bate-recorde-de-mortes-e-nao-reduz-crimes/