Maconha, Medicina e Jornalismo: Bate-papo com Susan Witte!

Ahhh… que saudade do conversativa! Vez ou outra a gente revive a sessão e troca uma ideia com algum convidado ilustre! Hoje vamos falar com a Susan Witte, jornalista autora do livro-reportagem O Uso Medicinal da Canábis, em breve nas livrarias. Saiba como foi o trabalho de pesquisa, o que mais a surpreendeu e também um pouco da política de drogas da Inglaterra, onde ela mora atualmente.

1) Como surgiu a ideia de fazer o livro e quanto tempo durou a pesquisa?

Eu tinha curiosidade sobre o assunto,  já tinha até morado na Califórnia, mas não sabia muito.  Aí comecei pela Wikipedia mesmo.  Logo aí já fiquei impressionada com o que li. Achei melhor buscar uma fonte mais confiável, pra ver se era verdade aquilo que estava lendo sobre a maconha,  que não tinha nada a ver com o que me ensinaram. Foi o livro do Denis Russo Burgierman,  “O Fim da Guerra”,  que fez toda a diferença. (…)

(…) Eu estava terminando o terceiro ano da faculdade de jornalismo (Faculdades Integradas Rio Branco) e estava na hora de pensar em um tema para o TCC. Tinham algumas pessoas que queriam fazer em grupo,  então propus esse tema pra elas.  Uma delas logo desistiu,  dizendo que não queria ter algo assim no currículo dela,  que ameaçava futuros empregos.  Os outros logo desistiram também e foram atrás de outro tema.  Eu acabei fazendo o TCC sozinha e decidi que o produto seria um livroreportagem.  O resultado foi uma monografia,  que eu adaptei para esse livro “O Uso Medicinal da Canábis”,  e um livro reportagem com perfis de pacientes que usam a maconha como forma de tratamento,  chamado “Ervas Daninhas” (não está publicado ainda). A pesquisa durou um pouco mais de um ano,  que é um tempo curto.  Eu não tive vida nessa época (rs).  Viajei para a Califórnia,  Rio de Janeiro,  Foz do Iguaçu e  São Vicente para entrevistar pessoas e buscar material de pesquisa.  Muitas das minhas citações foram traduzidas do inglês. Não tem muito material disponível no Brasil,  então foi importante ir buscar fontes nos Estados Unidos. 

2) Quais foram as duas ou três coisas que mais lhe chamaram a atenção durante os estudos?

O que mais me impressionou nesse trajeto foi o carinho das pessoas, especialmente os pacientes.  A Cidinha Carvalho,  mãe da Clarian,  que usa o óleo de canábis pra tratar síndrome de Dravet, é a pessoa mais forte e incrível que conheci.  O Gilberto Castro,  a Maria Antonia,  o Marco Antônio Barreto,  o Esdras Machado, o Beto Volpe e outros pacientes que foram tão generosos em compartilhar a história deles, foram importantíssimos. Eu me emocionava o  tempo todo, escrevia chorando. Eu achava que seria difícil entrevistar pessoas a favor da erva e estava completamente errada. Foi justamente o contrário. As pessoas que são contra o uso da maconha se mostraram inacessíveis e pouco úteis.  As fontes técnicas, os médicos e especialistas, concederam conversas extremamente elucidativas e ajudaram como podiam. Fora isso, praticamente tudo na pesquisa me impressionou, quanto mais eu descobria, mais eu queria saber, mais eu queria que outros soubessem, é um sentimento difícil de explicar.

3) Qual sua opinião sobre o uso da maconha em tratamento de câncer?

Eu acredito que o uso da maconha no tratamento de câncer será uma das maiores (re)descobertas da medicina.  Não há nada,  fora a lei,  impedindo pacientes de usar a canábis como um auxílio no tratamento tradicional. A canábis não interfere em outras formas de tratamento e ninguém precisa largar um para usar o outro.  Qual é o problema,  então,  de pacientes procurarem um tratamento complementar? O problema é que tratamento de câncer é um dos mais lucrativos da indústria e se os pacientes  começarem a usar e os médicos notarem um padrão de melhora nesses pacientes,  em comparação com os que não usam,  isso vai abrir as portas para mais estudos, mais aceitação e quebrar as pernas da indústria. Eu acredito que isso seja inevitável, cedo ou tarde, com o número crescente de pacientes buacando o auxílio da canábis, a visão da medicina em relação à erva vai mudar radicalmente. Não vai ser um processo rápido ou fácil, mas vai acontecer. E a indústria já está se preparando pra isso, elaborando seus próprios produtos e pesquisas.

4) Quem quiser adquirir o livro como deve fazer mesmo?

O livro estará disponível nas livrarias em breve – eu vou te informar melhor assim que receber informação da editora…

5) Conta pra gente como é o panorama em relação à política pública sobre maconha aí onde você está vivendo…

Aqui na Inglaterra é bem parecido com o Brasil em muitos aspectos. Todo mundo sabe que, se você não é branco, as chances de ser preso por causa de drogas são muito maiores; muita gente usa, mas não dá o braço a torcer; o governo é bem conservador em relação à legalização. Mas, uma pesquisa recente revelou que a maioria dos ingleses é a favor da legalização da maconha. Uma petição foi assinada por mais de 100 mil habitantes em dois dias pedindo a legalização. Essa petição vai ser debatida no parlamento dia 12 de outubro. Eu duvido que mude alguma coisa, mas pelo menos a população tem se mobilizado. O óleo de Charlotte’s Web foi liberado pra uso medicinal aqui e o Sativex também já é usado. O governo tem favorecido a indústria, que parece ser o caminho do Brasil também até agora.

6) Como foi para sua família descobrir que o assunto sobre o qual você escreveria seu livro era maconha?

Bom, a minha mãe, depois de tudo que aprendeu junto comigo, está virando ativista.  Meu pai, que é mais conservador, me surpreendeu apoiando o livro e ajudando a divulgar. Até o pessoal mais velho da família está interessado no assunto agora, estou bastante feliz com isso. Mostra que as pessoas não são tão proibicionistas quando estão melhor informadas.

7) Aproveita a atenção de quem leu até aqui e manda um recado pra galera do blog… Obrigado por se dedicar a cultura canábica!

Obrigada pela atenção e pelo apoio! É se informando,  refletindo e debatendo que vamos evoluir esse tema tão importante na sociedade.  O “papo de maconheiro” agora virou papo de todo mundo e evitar o assunto é perpetuar uma injustiça.