Maconha e Hinduísmo – Antiguidades Canábicas!

por Rafael Moraes

Aaaah, a Índia. Berço do Hinduísmo, do famoso festival primaveril Holi, da Odissi (dança tradicional), do delicioso curry, e da…MACONHA? Sim! Ela não só tem prestígio na história Indiana como também é objeto de veneração na religião Hindu. Só pra constar: os pioneiros no uso enteógeno e ritualístico da verdinha são os Hindus, tanto que ela é considerada uma das 5 plantas sagradas de acordo com o Atharva Veda (tipo de livro sagrado). O mesmo livro também narra que a planta é fruto do “Néctar Sagrado” (amrita) que teria caído na terra e originado-a. Fita quente: é hábito SAGRADO oferecer uma tigela de maconha para os outros durante o festival Durga Puja. Uma comparação análoga seria dizer que a Cannabis é sagrada para o Hinduísmo assim como o vinho é sagrado para o Cristianismo.

A bebida Indiana mais ilustre é feita com…MACONHA (duur). Isso mesmo, o Bhang é um drink exótico preparado com as folhas secas da Cannabis, e sua influencia na sociedade indiana foi tão relevante que ele era servido em casamentos e outras festas religiosas. Anfitriões que não serviam Bhang aos convidados durante uma visita amigável ou reunião familiar eram taxados de descorteses e misantrópicos. No século XII a bebida era consumida antes de conflitos armados para despertar a euforia e coragem nos soldados (assim como os vikings consumiam cogumelos alucinógenos e os europeus se entupiam de álcool antes das guerras), característica que rendeu ao drink o epíteto de “Vijaya” ou “bebida da vitória”. Sua origem remonta à lenda de que em certo dia escaldante, Shiva teria procurado por uma sombra para se refrescar e escolhera um pé de Cannabis para seu cochilo sagrado. Com o sucesso do cochilo, Shiva se encantara com a planta e teria presenteado-a aos humanos (valeu Shiva, é nois!).

Mas o Bhang é um drink consideravelmente fraco, com uma finalidade religiosa e meditativa. Se os indianos procuram por uma brisa fenomenal, eles caem de boca no Charas. E o que é o charas vocês me perguntam? Bem, simplesmente é um haxixe potente amplamente usado para fins medicinais e religiosos, que é rentável às populações do nordeste indiano e tem sua importância atribuída ao deus Shiva. Até a década de 80 esse néctar sagrado era legalizado e vendido em lojas do governo, mas graças a prepotência dos Estados Unidos (novamente interferindo nas culturas alheias), atualmente é criminalizado e punível de 10 anos de encarceramento. Claro, como uma óbvia consequência da criminalização, este fator não coíbe a venda de charas, já que o mesmo possui atributos sacros e é indispensável para os hinduístas.

E claro, como de costume em todas as culturas que tiveram contato com a Cannabis, a medicina indiana (comumente conhecida como Ayurveda) também foi fortemente influenciada pelos aspectos beneficentes da planta, principalmente a medicina holística! Reumatismo, malária, diarreia, convulsões, histeria, contrações gastrointestinais, tosse, dor pulmonar, intoxicação…Todos esses males eram (e ainda são) tratados ou amenizados com as propriedades da verdinha. Era comum também o uso de maconha como afrodisíaco, principalmente na noite de núpcias de um casal.

Resumindo: se tem algo que não falta na índia, é maconha! Em outro texto abordarei minuciosamente o movimento Rastafári, mas sem dúvida, a religião da maconha é o Hinduísmo! Então vem à tona a pergunta: se a Cannabis e suas variantes são intrínsecas à Índia e ao Hinduísmo, porque atualmente seu consumo no país é proibido (descriminalizado em algumas regiões do norte e nordeste apenas) ? Com a chegada dos neocolonizadores britânicos ao país, o consumo de charas e ganja (gíria local) foi desencorajado e estigmatizado, e com o tempo, a nova sociedade que ia se desenvolvendo em torno desses valores foi propagando a ideia errônea da maleficidade da Cannabis. Grupos religiosos, tradicionalistas e pró-legalização praticam sua luta diária de resistência a essa moral imperialista, e se Shiva, Vishnu, ou Brâma quiserem (e eu sei que eles querem hehehe), um dia o governo indiano reconhecerá a importância cultural e histórica da maconha, tornando-a acessível para a população.

Fontes:
http://www.holifestival.org/tradition-of-bhang.html
https://en.wikipedia.org/wiki/Charas
http://www.druglibrary.org/schaffer/hemp/history/first12000/1.htm
https://www.cnsproductions.com/pdf/Touw.pdf
https://books.google.com.br/books?hl=en&lr=&id=GHqV3elHYvMC&oi=fnd&pg=PP10&dq=Forces+of+Habit&ots=LhzDAe2AiO&sig=WPSqieJLktVihJoofw6D7iE_7m4#v=onepage&q=atharva&f=false