Exposição em São Paulo conta a história da maconha

Fonte: Galileu

A partir de terça-feira, 13, os paulistanos vão poder conhecer um pedaço do Hash & Marijuana Museum, museu da história da maconha com unidades em Amsterdã e em Barcelona. A exposição “A História da Cannabis: Uma Planta Proibida” traz a São Paulo peças que ajudam a contar a história do uso da cannabis como produto industrial, planta medicinal e da sua recente proibição, no início do século 20.

 

“Queremos contribuir para um debate fundamental sobre as leis sobre maconha no seu país, como fizemos décadas atrás na Holanda”, disse à GALILEU Ben Dronkers, fundador do Hash & Marijuana Musem e dono de outras duas empresas que têm a maconha como matéria prima – a Sensi Seeds e a Hemp Flex.

É a primeira vez que o Hash & Hemp Museum expõe fora da Europa, e os itens variam entre cordas e velas de barcos antigos feitos com fibra de cânhamo, vidros de maconha medicinal do fim do século 19 e peças modernas, feitas de plástico de fibra de maconha, por exemplo. Por causa da legislação brasileira, nenhuma peça exposta pode conter THC, o princípio ativo da planta (que dá o “barato”). Também serão exibidos filmes como Quebrando o Tabu e Cortina de Fumaça. A mostra é exclusiva para maiores de 18 anos.

Além das peças expostas, a mostra terá debates sobre as políticas brasileiras sobre maconha, além de exibir documentários que esclarecem fatos científicos sobre a planta. Leia a entrevista completa com o Dronkers:

Por que o Brasil foi escolhido como o primeiro país a receber essa exposição fora da Europa?

Na Holanda, estivemos diretamente envolvidos com a política de tolerância, desafiando os legisladores continuamente e ilustrando, através do empreendedorismo criativo, o absurdo de uma proibição de drogas leves na prática. O museu acompanha os acontecimentos internacionais com muito interesse, claro.

Opiniões e políticas estão mudando no seu continente, claro que mais notavelmente no Uruguai. O Brasil parece estar mais devagar, mas tem problemas maiores em segurança e violência que, para mim, estão diretamente relacionados a políticas falidas de combate às drogas. Apresentando essa exibição em São Paulo, nós queremos contribuir para um debate fundamental sobre as leis sobre maconha no seu país, como fizemos décadas atrás na Holanda.

Quais são suas peças favoritas?

Uma coleção importante de garrafas de cannabis medicinal da segunda metade do século 19 e das primeiras décadas do século 20. Mandamos alguns exemplares para o Brasil, objetos de uma época em que o uso de cannabis como ingrediente na medicina era muito normal. Além disso, eu gosto do descaramento do design das capas de livros raros como “Aint it Hay”, de 1949, ou “Marijuana”, de 1941, embora sejam produtos de uma época de propaganda anti-marijuana histérica financiada pelo governo dos EUA e pela mídia. As histórias desses livros são responsáveis por muitas das ideias erradas sobre o uso recreativo da cannabis. Segundo esses livros, a maconha te transforma em um estuprador e um assassino de sangue frio.

Como a exposição esclarece a importância da cannabis na história da humanidade?

Mostrando como o cânhamo e a cannabis em si têm sido especiais e ao mesmo tempo normais, parte da vida cotidiana, ao longo da história. As pessoas precisam de produtos têxteis para se manter quentes, e o cânhamo servia de matéria prima. As pessoas exploravam o mundo em barcos gigantes, e as velas e cordas que moviam esses navios eram feitos de fibra de cânhamo. A cannabis tem sido descrita como uma erva de cura por centenas de anos, em diferentes culturas, tanto que agora que cientistas estão fazendo pesquisas sobre as propriedades medicinais da planta, isso alinha perfeitamente com uma longa história da medicina, e com as pessoas usando recursos naturais para prolongar sua existência.

Quais foram os grandes desafios de fazer uma exposição sobre a cannabis aqui no Brasil, onde a erva é proibida?

Nós, é claro, não mandamos maconha, sementes ou produtos com THC. Para mim, de uma perspectiva holandesa, foi uma surpresa o nível de burocracia envolvido em mandar coisas simples como livros, um tear, um pedaço de corda ou um foto. Parece que o assunto é tão delicado que mesmo coisas que não são feitas com o princípio ativo da cannabis e portanto não são droga, mas um produto industrializado, são tratadas como se fossem.

Na sua opinião, o que de mais empolgante se descobriu sobre a maconha medicinal nos últimos tempos?

Pesquisas em curso sobre o efeito de diferentes canabinóides em tumores cancerígenos é uma delas. Apesar de muita evidência de relatos de pessoas pelo mundo, os pesquisadores estão tentando estabelecer evidências empíricas no assunto. A última pesquisa científica sobre o CBD parece muito promissora, especialmente porque aprendemos sobre os caminhos que fazem com que esse canabinóide destrua apenas células não-saudáveis.

Quais são os usos mais promissores da cannabis industrial?

Para ser honesto, há possibilidades muito variadas:  de construção civil a indústria automobilística, indústria têxtil a nutrição, além de indústria energética. Por isso, é difícil escolher uma. Um dos aspectos mais interessantes dessas aplicações é o potencial de diminuir nossa dependência do petróleo, permitindo a substituição por uma fonte de energia renovável e sustentável: o cânhamo.

Você acha que a legalização no ocidente em geral já é um caminho sem volta, considerando as mudanças de legislação nos EUA e no Uruguai nesse sentido?

Legalizar a venda de maconha em coffeeshops foi muito esperto por parte do governo holandês nos anos 1970. Tirou a venda de um contexto obscuro, do submundo, e levou para um ambiente controlado, benéfico para consumidores – que podem controlar a qualidade do produto e não precisam lidar com a violência do tráfico, por exemplo – e para as forças policiais, que podiam focar em crimes reais e violentos, não em pessoas fumando uma planta. Eu acho que abordar ou abuso de drogas de um ponto de vista de saúde pública, em vez de criminalizar usuários, é o único caminho. Não tenho ideia quanto tempo vai levar, mas tenho certeza que cada vez mais países vão legalizar, já que não há outra alternativa razoável.

Serviço

“A História da Cannabis: Uma Planta Proibida” – a partir de 13 de maio na Matilha Cultural.