É suficiente legalizar apenas o Cannabidiol?

por Sergio Vidal, Presidente da Associação Multidisciplinar de Estudos sobre Maconha Medicinal (AMEMM – Contatoamemm@gmail.com)

No último dia 14 de janeiro a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) decidiu regular os usos do cannabidiol (CBD). Em breve empresas, órgãos governamentais e instituições sem fins lucrativos poderão requerer autorização para cultivar maconha e produzir medicamentos à base da planta, desde que contenham exclusivamente CBD.

A maconha sintetiza naturalmente um número acima de 500 compostos, dos quais mais de 90 tipos são produzidos exclusivamente por plantas dessa espécie, os chamados cannabinóides. Entre os mais conhecidos estão o THC 9, THC 8, THCA, CBN, THCV, CBC, CBDA e o CBD, único liberado pela ANVISA para uso medicinal e pesquisas científicas.

A maconha é usada pelos seres humanos para diversas finalidades medicinais e terapêuticas há milhares de anos. A farmacopéia mais antiga da humanidade (livro medicinal contendo relação de doenças e respectivos remédios), datada de 3.750 antes de Cristo, já recomendava a erva para o tratamento de diferentes doenças e sintomas. Hoje, inúmeros cientistas em diferentes países aceitam o uso de remédios feitos à base de maconha como eficazes para tratar doenças e aliviar sintomas variados, entre as quais: AIDS, anemia falciforme, anorexia, ansiedade, artrite, ataxia, câncer, dependência por drogas, desordens digestivas, doença de crohn, distonia, dores crônicas, enxaqueca, cólicas, epilepsias, esclerose múltipla, esclerose amiotrófica lateral, espasticidade, glaucoma, reumatismo, dentre outras.

No Brasil, milhões de pessoas poderiam se beneficiar com o uso de fármacos contendo os princípios ativos da planta. No entanto, cada doença e enfermidade exige um equilíbrio bioquímico específico entre cannabinóides e um modo de administração próprio. Além disso cada variedade genética de maconha produz uma combinação específica desses compostos naturais.

Muitos estudos apontam o uso do cannabidiol isolado ou em combinação com diferentes doses de outros cannabinóides como muito eficiente no tratamento de algumas das doenças citadas. No entanto, apenas um número limitado de pacientes necessita de remédios contendo exclusivamente CBD. A grande maioria das doenças precisa de uma combinação dele com os outros compostos e alguns precisam inclusive de grandes doses de THC.

A regulamentação aprovada na última reunião da ANVISA é muito restritiva excluindo milhões de pessoas que necessitam de remédios com cannabinnóides que continuarão proibidos e também aqueles que não têm o dinheiro para arcar com os altos custos da importação. Cabe agora à sociedade civil organizada pressionar para que o governo e a Anvisa não mantenham essa regulamentação impeditiva e autorize o cultivo e produção nacional para fins de pesquisa e uso medicinal de todos os tipos de plantas de cannabis, com seus diferentes tipos de compostos medicinais.

As leis jamais deveriam ser feitas para bloquear o acesso de pessoas doentes aos medicamentos. O que realmente precisamos é de uma regulamentação dos usos da maconha para fins científicos e medicinais que seja plena e inclusiva e não atenda somente a alguns interesses específicos. É preciso que todos os tipos de remédios à base da planta, indicados para todas as enfermidades, estejam acessível e disponível a todos, inclusive através do Sistema Único de Saúde.